domingo, 4 de outubro de 2009

O educador construtivsta precisa se alimentar constantemente


Não seria construtivista levantar um escudo e ignorar um
estudo ou qualquer teoria sobre educação, como é o caso da
neurociência. Um dos princípios básicos é exatamente
agregar outros pontos de vista. Confrontar conhecimentos e
argumentos e evoluir com eles. A questão é que uma teoria
não precisa descaracterizar ou superar outra, mas
acrescentar conhecimento. Esta explicação está entre
muitas outras dadas pela professora Cleide Terzi, assessora
da área educacional, coordenadora de formação de
educadores e defensora do construtivismo.
Cleide esclarece que o construtivismo não é uma teoria
fechada, única. “É um conjunto de teorias”. Para ela, a
escola não realiza uma aplicação detalhada do
construtivismo. “Nossa intervenção na área do
conhecimento está alicerçada em alguns fundamentos
construtivistas. Etiquetar a escola não basta. A
compreensão do conhecimento, debruçando-se sobre a
teoria, é que vai consolidar a reflexão dos professores sobre
o fato de serem ou não construtivistas”, afirmou.
Ou seja, os educadores devem encontrar os princípios
com os quais se identificam e constatar se eles se
aproximam dos construtivistas. Precisam reavaliar se o
lugar deles como aprendizes ficou em algum lugar do
passado, em decorrência das mudanças de valores e
postura. “Não é um anúncio ou a determinação da
legislação que forma o professor construtivista. Ele se faz,
se constrói”, afirmou.
A professora explica que a origem do construtivismo está
ligada à mudança do apelo da escola que seguiu a exigência
transformadora da sociedade. Levando a uma nova postura
diante da experiência do saber. “Não interessa mais apenas
a descrição dos objetos e fenômenos, mas a aproximação
deles. Para que aconteçam interpretações e reflexões,
formando um sujeito pensante”, afirmou.
Ela conta que o construtivismo veio para se contrapor a
outras idéias que existiam. Como a dos inatistas, que
afirmavam que o sujeito já nasce mapeado pela
hereditariedade. E a dos deterministas que diziam que o
sujeito era fruto da influência do meio. “O construtivismo
leva em consideração as duas idéias. Considera os fatores
hereditários, ambientais e culturais”, disse.
A educadora esclarece que o construtivismo não pode ser
visto, nem criticado, como único. Há diferenças entre os
teóricos que o idealizaram. E isso acontece porque eles
viveram em épocas diferentes, cada um foi influenciado por
diferentes agentes, como tempo, espaço e cultura. Cada um
tem o seu modo de contemplar a realidade e se relacionar
com ela. “É diferente a concepção construtivista de Piaget,
que viveu na Suíça livre, da de seu contemporâneo
Vigotsky, que morava na Rússia Bolchevique. A visão deles
tem nuances e matizes de diferenciação. Pegar o Piaget,
simplesmente, para falar de todo o construtivismo é pobre.
Ele não é único”, disse.
Mesmo afirmando que a teoria construtivista não é única
nem está encerrada, pois vive em constante transformação,
a educadora identifica alguns princípios construtivistas que
são comuns a vários teóricos e que estão além das críticas
da neurociências. Ela explica que no construtivismo o
sujeito é ativo na sua aprendizagem. E que toda
aprendizagem se faz da intervenção do sujeito sobre o
objeto. Outro princípio básico é que todo humano tem
condições e direitos de desenvolver atos de aprendizagem.
E que esses atos se desenvolvem dentro de um coletivo.
Mas ela também ressalta que, até com relação aos
alicerces do construtivismo, vale lembrar que “teorias não
devem ser interpretadas como camisa de força. Não se deve
apropriar das idéias como se fossem slogans. O educador
precisa se aproximar das bases da teoria para refletir mais
profundamente sobre o fazer e o pensar dentro da escola”,
afirmou.
Para Cleide, o construtivismo, hoje, é uma ferramenta
que nos ajuda a rever o ato pedagógico. “O questionamento
como se ensina, foi substituído por como se aprende. E nesse
processo de encontro de conhecimentos, em nenhum
momento ninguém disse que a teoria construtivista
dispensa o professor. Quanto mais há a participação dos
alunos, mais é necessária a mediação de um adulto”,
afirmou.
Assim como a educadora também considera necessária a
avaliação. “As provas podem existir e devem ser exigentes.
Só que com a exigência do pensar e não a reprodução de
conhecimentos descritivos para o professor. A avaliação é
um desafio também para o educador. Não existem
avaliações construtivistas, se não houver aulas
construtivistas”, disse.
A professora acredita que os educadores conhecem
pouco sobre o funcionamento da mente humana, inclusive
ela considera que o pesquisador em educação não pode
recusar as pesquisas da neurociência. Só que uma teoria
não deve substituir, mas anexar conhecimentos à outra. “É
uma postura construtivista aceitar intervenções
interdisciplinares na construção do saber. Precisamos
dialogar com todos os profissionais interessados no
universo educacional. Não significa que vamos aceitar tudo,
mas que vamos aprender e interpretar”, afirmou.

(extraído de uma reportagem ao Diário do Grande ABC, de 6 de setembro de 2002)

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